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Touro

As últimas palavras de Jesus registradas por Mateus foram: “E certamente estou convosco todos os dias, até à consumação do século” (28:20b). A oração de Paulo era que deveríamos conhecer a largura, mas também o comprimento do amor de Cristo. Ora, se a largura diz respeito ao espaço, à extensão do Seu domínio, o comprimento diz respeito ao tempo.
O ser vivente que representa essa dimensão do amor de Cristo é o que se parece com o Touro. E Por quê o Touro? Porque aponta para os sacrifícios que eram exigidos pela Lei, para que o pecado fosse expiado.

“Mas nesses sacrifícios cada ano se faz recordação de pecados, porque é impossível que sangue de touros e de bodes tire os pecados (...) Mas este, havendo oferecido para sempre, um único sacrifício pelos pecados, assentou-se à destra de Deus (...) porque com um só oferta aperfeiçoou para sempre os que estão sendo santificados (...)Então acrescenta: E jamais me lembrarei dos seus pecados e das suas iniqüidades. Ora, onde há remissão destes, não há mais oferta pelo pecado”.
(Hb.3-4,12,14,16b,17-18).

Os sacrifícios oferecidos na Antiga Aliança tinham um prazo de validade determinado: um ano. Após esse prazo, um novo sacrifício deveria ser feito, para cobrir o pecado. Mas agora, na Nova Aliança, Jesus realizou um sacrifício eterno, que em vez de cobrir, remove de vez o pecado, e nos religa e reconduz à eternidade.
Fomos feitos para a Eternidade! Em Eclesiastes lemos que Deus “pôs a eternidade no coração dos homens” (3:11). Por isso o homem anela por ela. Entretanto, ele se depara com a triste realidade da morte. Seu maior temor é a inexistência. Ele quer existir, e viver para sempre. Faço aqui uma diferenciação entre existir e viver. Todos, indistintamente existirão para sempre. Porém, somente os que convergirem em Cristo viverão eternamente. Existir não é viver. Só há vida em Cristo. O resto é morte. Como disse W. Gadsby, “aprouve ao Pai que toda plenitude habitasse em Cristo; portanto, não há outra coisa senão o vazio em qualquer outra parte”. Trata-se do vazio existencial de que falou Sartre. Do desespero humano de que falou Kierkegaard.
Nas palavras de Kierkegaard, “o homem é uma síntese de infinito e de finito, de temporal e de eterno, de liberdade e de necessidade”[1]
Embora sejamos destinados à eternidade, vivemos agora confinados ao tempo. E o pior é que o tempo parece opor-se a nós. Tornou-se nosso maior adversário. Em nossa infância, temos a impressão que o tempo passa devagar, de maneira que idade adulta nunca chega. Mas quando chegamos à maioridade, nos damos conta de que ele passa bem mais rápido que imaginamos.
Diante da aterrorizadora possibilidade da morte, buscamos garantias. Queremos ser lembrados depois de nossa partida. E acima de tudo, queremos adentrar a eternidade na certeza de que encontraremos lá algo melhor do que o que deixarmos aqui.
Ah se Adão não houvesse comido aquele fruto! Deus o avisara que no dia em que o comesse, ele morreria. No momento em que o primeiro casal abocanhou o fruto proibido por Deus, a morte entrou em cena. Sem que eles se apercebessem, seus corpos começaram a envelhecer. A entropia chegara à criação. A Serpente passou a alimentar-se do pó da terra. Tal verdade é endossada pela Biologia. O ser humano começa a morrer no momento em que nasce.
De que maneira isso poderia ser revertido? O apetite da serpente parece não ter fim. Como lemos em Provérbios: “O inferno e a perdição nunca se fartam” (27:20a). Pelo contrário, “a sepultura aumenta o seu apetite, e abre a sua boca desmesuradamente” (Is.5:14a).
Como reverter esse estado de coisas?
O Eterno e Ilimitado Deus deveria adentrar o tempo e o espaço, e através de Seu sacrifício vicário desfazer a obra destrutiva, desencadeada pelo Diabo. Eis novamente o mistério kenótico! Uma vez que ao homem não lhe era possível transcender (ir para além de si, de encontro à Divindade), Deus teria que condescender (descer espontaneamente, para ir de encontro à criação). Que grande mistério é esse! Se nem o céu dos céus é capaz de contê-Lo, como Ele poderia ser contido no tempo e no espaço? Esse, porém, era o preço que deveria ser pago, caso desejasse restaurar a Criação ao seu estado original.
Somente encerrado em um corpo de carne, Ele poderia experimentar a morte, para que por meio dela “aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabo; e livrasse a todos os que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à escravidão” (Hb.2:14-15). Parafraseando Paulo, o “Rei Eterno, imortal, invisível”, “Aquele que tem, ele só, a imortalidade, e habita na luz inacessível”, “agora se manifestou pelo aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus, o qual destruiu a morte, e trouxe à luz a vida e a imortalidade pelo evangelho” (1 Tm.1:17; 6:16; 2 Tm.1:10).
A criação fora infectada por um vírus letal: o pecado. Era como um famigerado câncer, que corroendo-a por inteiro. Não se trata apenas de um mal moral, mas de uma espécie de epidemia de repercussão cósmica.
Somente uma poderosa vacina livraria a Criação desse vírus. Paulo escreve: “Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós” (2 Co.5:21). Como toda vacina, Cristo teria que entrar no corpo infectado, para expurgar o vírus. E foi o que, de fato, Ele fez. O corpo infectado a que me refiro é o Universo. O Deus transcedente, isto é, que vive para além do Universo, Se fez imanente, penetrando a Criação, para restaurar sua saúde original.
Por Sua morte, Cristo restaurou a saúde do Universo. O pecado foi banido! Embora os sintomas pareçam persistir, o vírus já foi eliminado. Paulo nos informa que “Deus, enviando o seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne” (Rm.8:3b).
Diferente dos sacrifícios exigidos na Antiga Aliança, que tinham que ser renovados ano após ano, o sacrifício de Cristo foi definitivo. Não se trata de um remédio em doses homeopáticas, mas de uma única dose. “Doutra forma”, declara o escritor sagrado, “necessário lhe fora padecer muitas vezes desde a fundação do mundo. Mas agora, na consumação dos séculos, uma vez por todas se manifestou, para aniquilar o pecado pelo sacrifício de si mesmo” (Hb.9:26).
A vacina foi preparada de antemão, antes mesmo da criação do cosmos. Por isso se diz que o Cordeiro foi morto desde antes da fundação do mundo. Mas a aplicação dela se deu na plenitude dos tempos, quando Cristo Se humanizou.
Uma vez livres do poder do pecado, somos reintroduzidos no projeto original de Deus: a eternidade. Uma vez vacinados, não há como ser infectados novamente. Nas palavras de Paulo, simplesmente estamos “mortos para o pecado” (Rm.6:11). Ele não exerce mais o mesmo poder que antes tinha sobre nós. “Mas agora, libertados do pecado, e feitos servos de Deus, tendes o vosso fruto para a santificação,e por fim a vida eterna” (Rm.6:22). Esse “por fim” não deve ser entendido como sendo algo que só teremos no fim de todas as coisas. Creio que a vida eterna é pra ser usufruída agora. Esse “por fim” significa “por objetivo”. O objetivo de Deus ao nos libertar do poder do pecado, é conceder-nos a vida eterna.
O amor de Deus exige que o objeto amado se torne eterno. É porque o “seu amor dura para sempre” (Ed.3:11), que “tudo o que Deus faz durará eternamente” (Ec.3:14). O único empecilho a isso era o pecado. Porém esse foi definitivamente vencido na Cruz.

Qual o comprimento do Seu amor?

Paulo diz que se desejamos ser tomados pelo Pleroma Divino, devemos compreender o comprimento do Seu amor. Jeremias, o profeta chorão, registrou uma das mais belas declarações de amor já feitas por Deus: “Com amor eterno te amei; com benignidade te atraí” (Je.31:3). Somente um amor eterno seria capaz de produzir um sacrifício eterno. A Cruz é eterna, e jamais perderá sua validade. E se ela é eterna, logo, o que ela produziu também deve ser eterno. Observe o que diz a Escritura:

“Mas Cristo, tendo vindo como sumo sacerdote dos bens já realizados, por meio de um maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos, isto é, não desta criação, e não por meio de sangue de bodes e bezerros, mas pelo seu próprio sangue, entrou no Santo dos Santos, uma vez por todas, havendo obtido uma eterna redenção” (Hb.9:11-12).

Se a redenção realizada na Cruz é eterna, logo, somos eternamente redimidos. Não há como anular a obra da Cruz.
Uma vez redimidos, eternamente redimidos.
A Cruz de Cristo desencadeou um processo que não pode ser revertido. Ela anulou o pecado em sua raiz, para que, paulatinamente, suas conseqüências sejam desfeitas.
A Bíblia nos garante que Jesus, “com uma só oferta aperfeiçoou para sempre os que estão sendo santificados” (Hb.10:14). A oferta do Seu corpo na Cruz nos aperfeiçoou para sempre, embora estejamos em franco processo de santificação. Se o bacilo da tuberculose foi eliminado, aos poucos as secreções e as tosses desaparecerão. O machado de Deus atingiu em cheio a raiz do problema. A árvore do pecado já foi desarraigada, e aos poucos vamos assistindo à sua folhagem murchar, secar e cair.
Ora, se Ele é o Autor, também deve ser o Consumador de nossa fé. Se foi Ele quem começou a boa obra, somente Ele pode terminá-la (Fp.1:6).
Quando compreendemos o comprimento do Seu amor, não vacilamos, nem duvidamos de Seu poder em nos “guardar de tropeçar” (Jd.24). Ele jamais vai desistir de nós. Ele concluirá o que começou em nós. Não há como Ele voltar atrás numa decisão tomada antes mesmo de nos criar. Os planos de Deus não podem ser alterados. Não são nossas imperfeições que vão conseguir comprometer o plano perfeito de Deus. O que está em jogo não é a perseverança do homem, mas a perseverança divina. Só um Deus perseverante pode exigir que os homens o sejam. Também não se trata do direito do homem de fazer suas próprias escolhas, e sim do inviolável direito de Deus em escolher.
A redenção do homem é o ponta-pé inicial para a redenção de todo o Cosmos.
A redenção torna tanto o homem quanto o Cosmos imortais.
Se o Universo está sujeito à corrupção, é por causa do pecado do homem. Quando este é redimido, aquele é restaurado. A criação está prenha de uma nova criação, que não mais estará sob a égide da morte e da corrupção. O novo céu e a nova terra não aparecerem do nada, como os originais, mas aparecem a partir dos que já existem. Uma criação que não seja mais sujeita à corrupção, só pode ser uma criação incorruptível.
O equilíbrio há muito perdido, desde a Queda, será reavido. Não haverá mais animais em extinção. O homem deixará de ser esse predador insaciável, para ocupar o lugar de vice-regente e guardião da criação.
Não. O universo não caminha para um big-crunch, como acreditam alguns cientistas. Ele caminha para a estabilidade.
Todo o Universo está impregnado da Glória de Deus. O sacrifício de Cristo não salva apenas o homem, mas redime toda a Criação.
Paulo diz que “Aquele que desceu é o mesmo que subiu acima de todos os céus, para encher todas as coisas”(Ef.4:10). Ele é Aquele “que enche tudo em todos”(Ef.1:23b). E no capítulo final da História, duas coisas se sucederão: 1 – Todo joelho se dobrará e confessará o Senhorio de Cristo (Fp.2:10-11); 2 – Deus será Tudo em Todos (1 Co.15:28).
Finalmente, será concluída “a redenção da propriedade de Deus, em louvor da sua glória”(Ef.1:14b).
Tudo será redimido! Esse será o tempo da “restauração de todas as coisas”de que falaram os profetas (At.3:21). Cada estrela, cada planeta, cada galáxia, cada espécie... Nada escapará do amor de Deus, nem mesmo os animais. “Naquele dia”, garante o Senhor, “farei por eles aliança com os animais do campo, com as aves do céu e com os répteis da terra. Da terra tirarei o arco, a espada e a guerra, e os farei deitar em segurança”(Os.2:18). Tal profecia encontra eco em Isaías: “Morará o lobo com o cordeiro, e o leopardo com o cabrito se deitará; o bezerro, e o filho de leão e o animal cevado viverão juntos, e um menino pequeno os guiará. A vaca e a ursa pastarão juntas, seus filhos juntos se deitarão, e o leão comerá palha como o boi. Brincará a criança de peito sobre a toca da áspide, e o já desmamado meterá a mão na cova do basilisco. Não se fará mal nem dano algum em todo o monte da minha santidade (o planeta Terra), pois a terra se encherá do conhecimento do Senhor, como as águas cobrem o mar”(Is.11:6-9).
O sangue de Cristo, além de prover a reconciliação entre Deus e o homem, também reconcilia as espécies entre si. O homem será plenamente reconciliado com todos os seres vivos. Não haverá mais hostilidade entre eles, para todo o sempre. E tudo isso, garantido pelo sacrifício realizado na Cruz.
Toda a criação aguarda, com ardente expectativa, a realização plena dessa promessa.
Não! O homem não será a única espécie viva a habitar a eternidade. Os quatro seres viventes do Apocalipse estão lá pra nos testificar disso.

[1] Sören Kierkegaard – O desespero humano, p.19.

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